A joalheria artesanal está no meu sangue, e a pesquisa das técnicas, experimentação e divulgação desse conhecimento são a minha força motriz no mundo da joalheria.
Sou fazedora de coisas desde criancinha, o que costumam chamar de multiapaixonada. Tudo o que envolve criação, construção e solução de problemas me atrai e me envolve. Conserto coisas quebradas, faço instalações elétricas, cozinho, crio sites, escrevo, desenho, fotografo, costuro, cuido de plantas, troco pneu de carro, resolvo qualquer pepino com computadores e celulares. E faço jóias.
Meu pai, Roberto, sempre teve uma oficina em casa. Lá ele consertava coisas e acumulava todo tipo de ferramentas, parafusos e cacarecos. Foi dele que eu herdei essas paixões. Da minha mãe, Maria Lucia, eu diria que herdei o talento para o desenho. Mas foi com a minha avó materna, Maria, que eu comecei no mundo do fazer, por volta dos sete anos de idade. Eu ia para a praia de Itanhaém com os meus avós todas as férias, e numa dessas viagens, ela encontrou um chumaço de fios elétricos coloridos bem fininhos - aqueles que a defunta TELESP largava na rua após fazer algum conserto de telefonia. Minha avó me ensinou a trançar, enrolar, escolher as cores e fazer pulseiras com aqueles fios. Fiquei encantada, e enchi a todos os incautos que passavam pelo meu caminho com aquelas "divinas jóias" feitas de lixo.
Aos 15 anos, tive a oportunidade de passar uma temporada em um colégio interno nos EUA, onde tive meu primeiro contato com um laboratório de metais e fiz as minhas primeiras jóias em prata: duas alianças lisas, um anel e um pingente serrados, um anel com pedra e até uma conta de vidro fundido no maçarico. Claro que os alunos só podiam mexer no arco de serra e nas limas - todas as soldas e cravações foram feitas pelo professor. Aquilo tudo me pareceu mágico demais para ser verdade, e essa experiência ficou guardada no fundo da minha memória como algo maravilhoso, porém inatingível.
Já no meu segundo ano da faculdade de Arquitetura e Urbanismo, tive uma matéria optativa de cenografia. Meu professor, Vicente Gil, um artista malucão, mandou que saíssemos pelo mundo explorando várias possibilidades artísticas. A FAU-USP, com todos seus defeitos, sempre foi incrível nesse sentido. E eu, vivendo os primórdios da Internet, fiz uma busca e descobri a única escola de joalheria que tinha um site em São Paulo, o Atelier Rodolfo Penteado. Isso era 1999. Fiz seis meses de aula nessa escola, e no próximo semestre, por um conflito de horário com as aulas na faculdade, mudei para a Escola Arte Metal, onde conheci meu maior mestre, Michael Striemer. Com ele aprendi a técnica e a precisão germânica no fazer, e a liberdade do traço e a busca pela linguagem individual no criar. E quando ele saiu para abrir a própria escola, mudei de mala e cuia para o novo Califórnia 120, onde fiquei até 2005.
Nessa época, já formada e sofrendo a pressão para "ganhar dinheiro e fazer alguma coisa na vida", descobri um material alternativo para joalheria me me encantou - a Art Clay Silver, uma massa de prata que podia ser modelada à mão, queimada em maçarico e possibilitava todo um novo leque de criações na joalheria. Entrei em contato com o fabricante no Japão, consegui a distribuição no mercado brasileiro (olha que loucura) e fui me meter a ser empresária, importadora e responsável pelo treinamento e certificação nesse material.
Só não diria que foi um retumbante fracasso, porque o material gerou muito interesse e eu consegui manter a empresa funcionando por 5 anos. Dei aulas e certifiquei mais de 200 pessoas, fiz dezenas de feiras, dei palestras e cursos em todo o Brasil e até nos EUA. Mas a alta do dólar e da prata, a burocracia e a corrupção nos sistemas de alfândega brasileiros, e a minha falta de experiência comercial acabaram pesando demais, e eu decidi encerrar as atividades no início de 2010. E voltei a estudar a joalheria tradicional na mesma Califórnia 120.
Nesse mesmo ano, me casei, vendi tudo e mudei com duas malinhas e um gato para Seattle, na costa oeste dos EUA. Em alguns meses consegui trabalho em uma fundição de jóias, onde fiz de tudo - desde limpar o chão, injetar ceras, fazer moldes até acabamento de peças. Nesse período, me envolvi com uma comunidade de joalheiros-artistas muito ativa e efervescente, fui voluntária em exposições e conferências da área, e acabei conhecendo algumas joalheiras incríveis com quem acabei trabalhando. Com a escultora Catherine Grisez aprendi a fazer forja, repuxo e cinzelado. No estúdio da joalheira Gina Pankowski, onde comecei como assistente de bancada e em três anos me tornei diretora de estúdio, aprendi a fazer jóias esculturais e complexas, a trabalhar na bancada com rapidez e eficiência, viajei para fazer feiras de arte e joalheria por todos os EUA e ajudei a gerir seu negócio, seu site, fotos, vendas, etc. Paralelamente, comecei a me interessas por modelagem 3D, fiz cursos de Rhino, de escultura 3D no ZBrush, e comecei a produzir as minhas primeiras peças feitas no computador e impressas em 3D.
Com meu divórcio e mudança de volta ao Brasil, precisava, mais uma vez, recomeçar do zero. Mas aqui no Brasil eu tinha a minha família joalheira no Califórnia 120, e comecei a dar aulas de joalheria de bancada lá.
Logo depois fui contratada para trabalhar como gestora de contas em uma fábrica de jóias em São Paulo. Para manter o nível desse texto num patamar razoável, não vou detalhar o inferno que foram os 4 meses que passei lá, os abusos que testemunhei e as práticas que ameaçaram matar toda a idéia de valor que a joalheria tinha para mim. Pedi demissão, voltei a dar aulas, e comecei o longo processo de recomeçar meu ateliê e a me reconectar com o que fazia sentido para mim - a Slow Jewelry. Vou contar mais sobre essa minha idéia da joalheria em outro post.
Se há muitas vantagens em envelhecer, diria que a claridade que o amadurecimento traz é a maior delas. Por mais que o mundo diga e exija produtividade e sucesso, ele só traz felicidade se esse trabalho estiver conectado com seus valores e com o que faz sentido para você. Serei eternamente um projeto em andamento, mas me sinto mais próxima da minha essência a cada dia que passa. Hoje, me divido entre o prazer de passar o conhecimento adquirido para a nova geração, em duas escolas em São Paulo: o Atelier Califórnia 120, e o Atelier Amanda Chohfi; A fazer jóias com significado para clientes que querem marcar eventos e presentear pessoas especiais; A desenvolver modelagens, jóias a coleções para outras marcas e estilistas que vêem valor na criação de peças únicas e especiais; e a cultivar a produção das minhas jóias autorais, feitas com calma, paixão e esmero.
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